(…) Decido.
O sistema REINTEGRA tem como objetivo restituir parcial ou integralmente o resíduo tributário remanescente na cadeia de produção de bens exportados. O contribuinte poderá apurar crédito mediante a aplicação de um percentual que será estabelecido em ato do Ministro da Fazenda, sobre a receita auferida com a exportação desses bens para o exterior.
Trata-se de benefício fiscal com lastro no art. 21 da Lei nº 13.043/2014 (antiga Medida Provisória nº 540/2011), para possibilitar ao contribuinte/exportador receber parcial ou integralmente o resíduo tributário remanescente na cadeia de produção de bens exportados (tratados no art. 23); seu cenário é delineado no art. 22, onde está dito que cabe ao Poder Executivo estabelecer percentual sobre a receita auferida com a exportação dos bens tratados no art. 23 destinados, podendo esse percentual variar entre 0,1% e 3%.
Trata-se de benefício fiscal em que a lei autoriza o Poder Público a “abrir mão” de receitas públicas, deixando-lhe um espaço discricionário para o manejo das alíquotas.
Foi publicado na edição extra do Diário Oficial da União, de 30 de maio de 2018, o Decreto n.º 9.393/2018 alterando o Decreto nº 8.415/2015, que regulamenta a aplicação do Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras – Reintegra. Como já foi dito, o Reintegra – que impacta PIS/COFINS – permite a apuração de crédito pela pessoa jurídica que exporte bens, mediante a aplicação de percentual sobre a receita auferida com a exportação, desde que, cumulativamente:
a) o produto tenha sido industrializado no País;
b) esteja classificado em código da Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados (TIPI) e relacionado no anexo do Decreto nº 8.415/2015; e
c) tenha custo total de insumos importados que não seja superior ao limite percentual do preço de exportação estabelecido no referido anexo.
Conforme mais essa alteração feita pelo Governo (Decreto n.º 9.393), para apuração do crédito – que é um benefício fiscal – no âmbito do Reintegra, será aplicado o percentual de um décimo por cento, a partir de 1º de junho de 2018. Ou seja, o decreto reduziu a alíquota do benefício de 2,0% para 0,1%, valendo já a partir de 1º de junho.
Sucede que bem pouco antes, apreciando anterior alteração de alíquota do Reintegra, o STF já havia apontado a falta de respeito à noventena. Verbis:
DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DO CPC/2015. PROGRAMA REINTEGRA. PIS E COFINS. APROVEITAMENTO DE CRÉDITOS. REVOGAÇÃO DE BENEFÍCIO FISCAL. REDUÇÃO DA ALÍQUOTA. MAJORAÇÃO INDIRETA DE TRIBUTO. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE NONAGESIMAL. CONSONÂNCIA DA DECISÃO AGRAVADA COM A JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AGRAVO MANEJADO SOB A VIGÊNCIA DO CPC/2015.
1. O entendimento assinalado na decisão agravada não diverge da jurisprudência firmada no Supremo Tribunal Federal. Ao julgamento da ADI 2.325-MC, Rel. Min. Marco Aurélio, Plenário, esta Suprema Corte decidiu que a revogação de benefício fiscal, quando acarrete majoração indireta de tributos, deve observar o princípio da anterioridade nonagesimal.
2. As razões do agravo interno não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada.
3. Em se tratando de mandado de segurança, inaplicável o artigo 85, §§ 2º, 3º e 11, do CPC/2015.
4. Agravo interno conhecido e não provido.” (RE n° 983.821 AgR, STF, 1ª T, Rel. Min. Rosa Weber, j. 03/04/2018, .p. em 16/04/2018)
Agravo regimental no recurso extraordinário. Tributário. REINTEGRA. Decreto nº 8.415/15. Princípio da anterioridade nonagesimal.
1. O entendimento da Corte vem se firmando no sentido de que não só a majoração direta de tributos atrai a aplicação da anterioridade nonagesimal, mas também a majoração indireta decorrente de revogação de benefícios fiscais.
2. Negativa de provimento ao agravo regimental. Não se aplica ao caso dos autos a majoração dos honorários prevista no art. 85, § 11, do novo Código de Processo Civil, uma vez que não houve o arbitramento de honorários sucumbenciais pela Corte de origem (Súmula 512/STF). (RE nº 1.081.041/SC, 2ª T, Rel. Min. Edson Fachin, DJe de 27/4/18)
Mas a 1ª Turma do STF foi mais além, reclamando ainda a anterioridade anual. Confira-se:
REINTEGRA – DECRETOS Nº 8.415 E Nº 8.543, DE 2015 – BENEFÍCIO – REDUÇÃO DO PERCENTUAL – ANTERIORIDADE – PRECEDENTES. Promovido aumento indireto de tributo mediante redução da alíquota de incentivo do Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras REINTEGRA, cumpre observar o princípio da anterioridade, geral e nonagesimal, constante das alíneas b e c do inciso III do artigo 150 da Constituição Federal. Precedente: medida cautelar na ação direta de inconstitucionalidade nº 2.325/DF, Pleno, relator ministro Marco Aurélio, acórdão publicado no Diário da Justiça de 6 de outubro de 2006. (RE 964850 AgR, 1ª T, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 08/05/2018, Processo Eletrônico DJe-128 Divulg 27/06/2018 Public 28/06/2018)
AGRAVO INTERNO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
1. O acórdão recorrido encontra-se em harmonia com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, no sentido de ser imperativa a observância do princípio da anterioridade, geral e nonagesimal (art. 150, III, b e c, da Constituição Federal), em face de aumento indireto de tributo decorrente da redução da alíquota de incentivo do Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras (REINTEGRA).
2. Nesse sentido, o RE 964.850 AgR, desta 1ª Turma, Relator o ilustre Min. MARCO AURÉLIO, julgado em 8/5/2018; e o RE 1.081.041 AgR, 2ª Turma, Relator o ilustre Min. DIAS TOFFOLI, DJe de 27/4/2018.
3. Agravo Interno a que se nega provimento. Não se aplica o art. 85, § 11, do CPC/2015, tendo em vista que não houve fixação de honorários advocatícios nas instâncias de origem. (RE 1040084 AgR, 1ª T, Rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 29/05/2018, Processo Eletrônico DJe-120 Divulg 15/06/2018 Public 18/06/2018)
Esse entendimento mostra-se em consonância com o pensar que se pacificou na Suprema Corte, no sentido de que atrai a incidência do princípio da anterioridade a majoração indireta de tributo proveniente da redução ou extinção de benefício fiscal, conforme voto de lavra do Min. Marco Aurélio, proferido no julgamento da MC-ADI 2.325/DF, DJ 06/10/2006.
No voto proferido pelo Min. Gilmar Mendes no RE 1105918 AGR/SC, 2ª Turma, julgado em sessão virtual de 8.6.2018 a 14.6.2018, considerou-se que “…ao reduzir o percentual para apuração do crédito a ser compensado no âmbito do Reintegra, implicou aumento indireto da carga tributária do agravado. Isso porque, na medida em que restringiu a extensão de incidência do incentivo, acabou por onerar indiretamente a operação da cadeia de exportação. Desse modo, inafastável na espécie a incidência do princípio da anterioridade nonagesimal”.
No mesmo sentido pode-se apontar decisões monocráticas (RE 970.955/SC, Rel. Min. Dias Toffoli; RE 775.181/SC, Rel. Min. Gilmar Mendes; RE 1.026.463/RS, Rel. Min. Rosa Weber; ARE 985.209/RO, Rel. Min. Marco Aurélio, RE 1053254/RS, Rel. Min. Luis Barroso) que se orientam pela incidência da anterioridade já que a súbita revogação de benefício fiscal implica em aumento indireto de carga tributária.
Ora, se – conforme dito pelo STF – a redução da alíquota que impactou a cadeia de importação resultou no aumento de carga tributária – o certo é que incida a limitação constitucional referente a anterioridade anual (art. 150, III, “b”, CF), porquanto houve alteração da base de cálculo com o expurgo na apuração de crédito pela pessoa jurídica exportadora. Observo, obter dictum, que na verdade as três alíneas do inc. III do art. 150 incidem ao mesmo tempo (irretroatividade – anterioridade – anterioridade nonagesimal) salvo as exceções da própria Magna Carta.
Alias, cumpre observar que a redução da alíquota para 0,1% é o mesmo que anular o benefício/incentivo fiscal; não tem cabimento um “incentivo” a cadeia exportadora inferior à grandeza unitária, muito próximo de zero.
Nesse cenário jurisprudencial – ao qual adiro, revendo entendimento pessoal anterior – deve ser assegurado até o fim de 2018 o percentual de 2,0%.
Pelo exposto, defiro o pedido de antecipação dos efeitos da tutela recursal.
Comunique-se ao MM. Juízo “a quo”.
À contraminuta.
Após, ao Ministério Público Federal.
Publique-se e cumpra-se. (AI(202) Nº 5019080-10.2018.4.03.0000, TRF3 – SP, 6ª T, Rel. Des. Fed. Johonsom Di Salvo, j. 14/08/2018)