TRIBUTÁRIO. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DO SÓCIO GESTOR DE EMPRESA EXECUTADA, NÃO LOCALIZADA NO SEU DOMICÍLIO FISCAL. (IR)REGULARIDADE DA DISSOLUÇÃO. ÔNUS DA PROVA. COMUNICAÇÃO DA INATIVIDADE DA EMPRESA À RECEITA FEDERAL DO BRASIL. MERA ETAPA PROCEDIMENTAL DA DISSOLUÇÃO REGULAR DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA. AUSÊNCIA DE ALEGAÇÃO DA DEVIDA LIQUIDAÇÃO, COM O LEVANTAMENTO DO ATIVO E PAGAMENTO DOS CREDORES PREFERENCIAIS. CIRCUNSTÂNCIA INSUFICIENTE PARA PROVAR A REGULARIDADE DA DISSOLUÇÃO DA EMPRESA EXECUTADA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 435/STJ. PRESCRIÇÃO PARA O REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO FISCAL. INOCORRÊNCIA. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.
I- No caso, foi deferido o redirecionamento, ao sócio-gerente, da execução fiscal ajuizada contra a empresa executada, ante a certidão do Oficial de Justiça, no sentido de que não fora ela localizada no seu endereço fiscal. Oposta Exceção de Pré-executividade, pelo sócio-gerente, requerendo a extinção da execução fiscal, em relação ao excipiente, em face de sua ilegitimidade passiva e da ocorrência de prescrição, foi a Exceção rejeitada, mantida a decisão, pelo acórdão recorrido.
II- Quanto à alegada ilegalidade do redirecionamento da execução fiscal ao sócio-gerente, defende o recorrente a tese de que – em razão de não lhe ter sido supostamente permitido registrar o distrato da empresa executada perante a Junta Comercial do Estado do Rio Grande do Sul, pelo fato de lhe ter sido exigida certidão negativa de débitos federais (antes da edição da Lei Complementar 147/2014, que alterou o art. 9º da Lei Complementar 123/2006 e passou a permitir a baixa dos atos constitutivos da empresa, independentemente da regularidade tributária), aliada à circunstância de ter informado à Receita Federal do Brasil, por meio de suas declarações fiscais, a inatividade da empresa, e de seu nome não constar da certidão de dívida ativa – estaria elidida a presunção de que trata a Súmula 435/STJ (“Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente”), cabendo ao Fisco, nesse contexto, o ônus de comprovar a dissolução irregular da executada, para viabilizar o redirecionamento da execução fiscal, com fundamento no art. 135, III, do CTN, não sendo bastante a certidão do Oficial de Justiça que comprova a frustração da tentativa de citação.
III- No caso dos autos, o sócio gestor não afirma ter dissolvido regularmente a empresa executada, no sentido de ter procedido à arrecadação do ativo e ao pagamento do passivo. Limita-se a postular o afastamento da presunção de dissolução irregular da sociedade executada, pela circunstância de ter comunicado, à Receita Federal do Brasil, o encerramento de suas atividades. À toda evidência, defende uma interpretação equivocada do teor da Súmula 435/STJ e da distribuição do ônus da prova do indigitado ilícito, qual seja, a dissolução irregular da executada.
IV- Com efeito, o entendimento que subjaz do enunciado sumular 435/STJ não é o de que apenas na hipótese em que a empresa deixa de comunicar a alteração do seu domicílio fiscal aos órgãos competentes será possível presumir a sua dissolução irregular. Aliás, “para fins de aplicação do entendimento firmado na Súmula 435 do STJ, é necessário a verificação de cada caso concreto, ‘não sendo razoável se proceder ao redirecionamento da execução fiscal, baseando-se, tão somente, em simples devolução de AR-postal sem cumprimento, impondo-se, nesse particular, que se utilizem meios outros para verificação, localização e citação da sociedade empresária'” (STJ, AgRg no AgRg no REsp 1.358.007/SP, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, DJe de 18/12/2013).
V- Não é o simples fato de a empresa não ser localizada em seu domicílio fiscal que enseja o redirecionamento da execução fiscal, mas, sim, o de ter sido ela dissolvida irregularmente. A circunstância de não ter sido localizada em seu domicílio fiscal é apenas uma presunção desta ocorrência, que é relativa.
VI- A jurisprudência do STJ há muito caminha no sentido de que o ônus da prova de atuação irregular do sócio gestor, para fins de redirecionamento da execução fiscal, é da Fazenda Pública, quando o nome deste não constar da certidão de dívida ativa, e do gestor, quando o seu nome constar do título executivo. Contudo, na hipótese em que a responsabilização do sócio decorre da dissolução irregular, tal “responsabilização do sócio decorre do disposto no art. 135, III, do CTN e não tem como pressuposto o nome do sócio constar da CDA” (STJ, AgInt no REsp 1.850.370/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 16/11/2020), o que permite concluir que o ônus da prova recai sobre o Fisco, quando se imputa responsabilidade ao sócio-gerente por fato que precede a dissolução irregular, na circunstância de o nome deste não constar da certidão de dívida ativa (prática de fraudes, simulação, crimes fiscais, entre outros).
VII- No caso dos autos, o próprio sócio-gerente reconhece que a empresa executada foi dissolvida. O que se pretende é afastar a presunção de que tal dissolução foi irregular, pela simples circunstância de ele ter comunicado a inatividade da sociedade empresária, nas declarações fiscais enviadas à Receita Federal do Brasil, o que não encontra amparo na jurisprudência do STJ.
VIII- De fato, tais declarações são apenas uma das etapas da dissolução dita regular, que pressupõe, conforme precedente do STJ, firmado em recurso repetitivo, a “obediência aos ritos e formalidades previstas nos arts. 1.033 a 1.038 e arts. 1.102 a 1.112, todos do Código Civil de 2002 – onde é prevista a liquidação da sociedade com o pagamento dos credores em sua ordem de preferência – ou na forma da Lei n. 11.101/2005, no caso de falência” (STJ, REsp 1.371.128/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 17/09/2014). Com efeito, “os julgados mais recentes do STJ afirmam que a legislação societária, a doutrina e a jurisprudência registram que o distrato social é apenas uma das fases (in casu, a primeira) do procedimento de extinção da pessoa jurídica empresarial. Após o distrato, procede-se ainda à liquidação, ou seja, à realização do ativo e pagamento do passivo (e eventual partilha de bens remanescentes, em sendo o caso), para, então, decretar-se o fim da personalidade jurídica (…)” (STJ, AgInt no AREsp 1.511.227/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 18/05/2020).
IX- É absolutamente razoável estabelecer, ao sócio gestor da empresa executada ao tempo da sua dissolução, o ônus da comprovação de que ela se procedeu de forma regular. É que se estará a exigir, do sócio administrador, apenas a comprovação de que fez o que a lei lhe determina. Exigir tal do Fisco, ao revés, mostra-se irrazoável, por resultar em ônus probatório demasiadamente complexo, quando não impossível. É lidimo, portanto, que a jurisprudência alcance hipóteses de presunção de dissolução irregular da empresa executada, como a que decorre da situação prevista na Súmula 435/STJ, sem que tal implique incompatibilidade com a Súmula 430 desta Corte.
X- Sendo inequívoca a ocorrência da dissolução da empresa executada – no caso, confessada pelo contribuinte, em suas declarações fiscais, e reafirmada nas razões recursais -, é razoável atribuir, ao seu sócio gestor, o ônus da prova de que ela se deu de forma regular, porquanto tem ele à sua disposição todas as informações da sociedade executada concernentes ao patrimônio, operações, livros empresariais, contas bancárias, entre outras.
XI- No julgamento do REsp 1.201.993/SP, submetido à sistemática dos recursos repetitivos (Tema 444), fixou esta Corte o entendimento de que “(i) o prazo de redirecionamento da Execução Fiscal, fixado em cinco anos, contado da diligência de citação da pessoa jurídica, é aplicável quando o referido ato ilícito, previsto no art. 135, III, do CTN, for precedente a esse ato processual” (STJ, REsp 1.201.993/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 12/12/2019).
XII- Assim, o termo a quo do prazo prescricional da pretensão de redirecionar a execução fiscal, em face do sócio gestor ao tempo da dissolução irregular (ou da presunção de sua ocorrência), por este ilícito tributário, quando ocorrente antes da citação da empresa executada – como no caso -, corresponde à data da diligência citatória frustrada.
XIII- Não tendo decorrido prazo superior a 5 (cinco) anos entre a diligência citatória negativa da empresa executada (04/05/2012), não localizada em seu domicílio fiscal, e a citação do sócio gestor (15/08/2014), inocorrente a prescrição para o redirecionamento da execução fiscal, no caso.
XIV- Recurso Especial improvido. (REsp 1.877.340-RS, STJ, 2ª T, Rel. Min. Assusete Magalhães, j. 26/04/22, DJE 29/04/22)