Informativo

9 de maio de 2022

Execução fiscal. Responsabilidade do sócio gestor. (Ir)regularidade da dissolução da empresa. Ônus da prova. Prescrição

TRIBUTÁRIO. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DO SÓCIO GESTOR DE EMPRESA EXECUTADA, NÃO LOCALIZADA NO SEU DOMICÍLIO FISCAL. (IR)REGULARIDADE DA DISSOLUÇÃO. ÔNUS DA PROVA. COMUNICAÇÃO DA INATIVIDADE DA EMPRESA À RECEITA FEDERAL DO BRASIL. MERA ETAPA PROCEDIMENTAL DA DISSOLUÇÃO REGULAR DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA. AUSÊNCIA DE ALEGAÇÃO DA DEVIDA LIQUIDAÇÃO, COM O LEVANTAMENTO DO ATIVO E PAGAMENTO DOS CREDORES PREFERENCIAIS. CIRCUNSTÂNCIA INSUFICIENTE PARA PROVAR A REGULARIDADE DA DISSOLUÇÃO DA EMPRESA EXECUTADA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 435/STJ. PRESCRIÇÃO PARA O REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO FISCAL. INOCORRÊNCIA. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.

I- No caso, foi deferido o redirecionamento, ao sócio-gerente, da execução fiscal ajuizada contra a empresa executada, ante a certidão do Oficial de Justiça, no sentido de que não fora ela localizada no seu endereço fiscal. Oposta Exceção de Pré-executividade, pelo sócio-gerente, requerendo a extinção da execução fiscal, em relação ao excipiente, em face de sua ilegitimidade passiva e da ocorrência de prescrição, foi a Exceção rejeitada, mantida a decisão, pelo acórdão recorrido.

II- Quanto à alegada ilegalidade do redirecionamento da execução fiscal ao sócio-gerente, defende o recorrente a tese de que – em razão de não lhe ter sido supostamente permitido registrar o distrato da empresa executada perante a Junta Comercial do Estado do Rio Grande do Sul, pelo fato de lhe ter sido exigida certidão negativa de débitos federais (antes da edição da Lei Complementar 147/2014, que alterou o art. 9º da Lei Complementar 123/2006 e passou a permitir a baixa dos atos constitutivos da empresa, independentemente da regularidade tributária), aliada à circunstância de ter informado à Receita Federal do Brasil, por meio de suas declarações fiscais, a inatividade da empresa, e de seu nome não constar da certidão de dívida ativa – estaria elidida a presunção de que trata a Súmula 435/STJ (“Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente”), cabendo ao Fisco, nesse contexto, o ônus de comprovar a dissolução irregular da executada, para viabilizar o redirecionamento da execução fiscal, com fundamento no art. 135, III, do CTN, não sendo bastante a certidão do Oficial de Justiça que comprova a frustração da tentativa de citação.

III- No caso dos autos, o sócio gestor não afirma ter dissolvido regularmente a empresa executada, no sentido de ter procedido à arrecadação do ativo e ao pagamento do passivo. Limita-se a postular o afastamento da presunção de dissolução irregular da sociedade executada, pela circunstância de ter comunicado, à Receita Federal do Brasil, o encerramento de suas atividades. À toda evidência, defende uma interpretação equivocada do teor da Súmula 435/STJ e da distribuição do ônus da prova do indigitado ilícito, qual seja, a dissolução irregular da executada.

IV- Com efeito, o entendimento que subjaz do enunciado sumular 435/STJ não é o de que apenas na hipótese em que a empresa deixa de comunicar a alteração do seu domicílio fiscal aos órgãos competentes será possível presumir a sua dissolução irregular. Aliás, “para fins de aplicação do entendimento firmado na Súmula 435 do STJ, é necessário a verificação de cada caso concreto, ‘não sendo razoável se proceder ao redirecionamento da execução fiscal, baseando-se, tão somente, em simples devolução de AR-postal sem cumprimento, impondo-se, nesse particular, que se utilizem meios outros para verificação, localização e citação da sociedade empresária'” (STJ,  AgRg no AgRg no REsp 1.358.007/SP, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, DJe de 18/12/2013).

V- Não é o simples fato de a empresa não ser localizada em seu domicílio fiscal que enseja o redirecionamento da execução fiscal, mas, sim, o de ter sido ela dissolvida irregularmente. A circunstância de não ter sido localizada em seu domicílio fiscal é apenas uma presunção desta ocorrência, que é relativa.

VI- A jurisprudência do STJ há muito caminha no sentido de que o ônus da prova de atuação irregular do sócio gestor, para fins de redirecionamento da execução fiscal, é da Fazenda Pública, quando o nome deste não constar da certidão de dívida ativa, e do gestor, quando o seu nome constar do título executivo. Contudo, na hipótese em que a responsabilização do sócio decorre da dissolução irregular, tal “responsabilização do sócio decorre do disposto no art. 135, III, do CTN e não tem como pressuposto o nome do sócio constar da CDA” (STJ, AgInt no REsp 1.850.370/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 16/11/2020), o que permite concluir que o ônus da prova recai sobre o Fisco, quando se imputa responsabilidade ao sócio-gerente por fato que precede a dissolução irregular, na circunstância de o nome deste não constar da certidão de dívida ativa (prática de fraudes, simulação, crimes fiscais, entre outros).

VII- No caso dos autos, o próprio sócio-gerente reconhece que a empresa executada foi dissolvida. O que se pretende é afastar a presunção de que tal dissolução foi irregular, pela simples circunstância de ele ter comunicado a inatividade da sociedade empresária, nas declarações fiscais enviadas à Receita Federal do Brasil, o que não encontra amparo na jurisprudência do STJ.

VIII- De fato, tais declarações são apenas uma das etapas da dissolução dita regular, que pressupõe, conforme precedente do STJ, firmado em recurso repetitivo, a “obediência aos ritos e formalidades previstas nos arts. 1.033 a 1.038 e arts. 1.102 a 1.112, todos do Código Civil de 2002 – onde é prevista a liquidação da sociedade com o pagamento dos credores em sua ordem de preferência – ou na forma da Lei n. 11.101/2005, no caso de falência” (STJ, REsp 1.371.128/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 17/09/2014). Com efeito, “os julgados mais recentes do STJ afirmam que a legislação societária, a doutrina e a jurisprudência registram que o distrato social é apenas uma das fases (in casu, a primeira) do procedimento de extinção da pessoa jurídica empresarial. Após o distrato, procede-se ainda à liquidação, ou seja, à realização do ativo e pagamento do passivo (e eventual partilha de bens remanescentes, em sendo o caso), para, então, decretar-se o fim da personalidade jurídica (…)” (STJ, AgInt no AREsp 1.511.227/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 18/05/2020).

IX- É absolutamente razoável estabelecer, ao sócio gestor da empresa executada ao tempo da sua dissolução, o ônus da comprovação de que ela se procedeu de forma regular. É que se estará a exigir, do sócio administrador, apenas a comprovação de que fez o que a lei lhe determina. Exigir tal do Fisco, ao revés, mostra-se irrazoável, por resultar em ônus probatório demasiadamente complexo, quando não impossível. É lidimo, portanto, que a jurisprudência alcance hipóteses de presunção de dissolução irregular da empresa executada, como a que decorre da situação prevista na Súmula 435/STJ, sem que tal implique incompatibilidade com a Súmula 430 desta Corte.

X- Sendo inequívoca a ocorrência da dissolução da empresa executada – no caso, confessada pelo contribuinte, em suas declarações fiscais, e reafirmada nas razões recursais -, é razoável atribuir, ao seu sócio gestor, o ônus da prova de que ela se deu de forma regular, porquanto tem ele à sua disposição todas as informações da sociedade executada concernentes ao patrimônio, operações, livros empresariais, contas bancárias, entre outras.

XI- No julgamento do REsp 1.201.993/SP, submetido à sistemática dos recursos repetitivos (Tema 444), fixou esta Corte o entendimento de que “(i) o prazo de redirecionamento da Execução Fiscal, fixado em cinco anos, contado da diligência de citação da pessoa jurídica, é aplicável quando o referido ato ilícito, previsto no art. 135, III, do CTN, for precedente a esse ato processual” (STJ, REsp 1.201.993/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 12/12/2019).

XII- Assim, o termo a quo do prazo prescricional da pretensão de redirecionar a execução fiscal, em face do sócio gestor ao tempo da dissolução irregular (ou da presunção de sua ocorrência), por este ilícito tributário, quando ocorrente antes da citação da empresa executada – como no caso -, corresponde à data da diligência citatória frustrada.

XIII- Não tendo decorrido prazo superior a 5 (cinco) anos entre a diligência citatória negativa da empresa executada (04/05/2012), não localizada em seu domicílio fiscal, e a citação do sócio gestor (15/08/2014), inocorrente a prescrição para o redirecionamento da execução fiscal, no caso.

XIV- Recurso Especial improvido. (REsp 1.877.340-RS, STJ, 2ª T, Rel. Min. Assusete Magalhães, j. 26/04/22, DJE 29/04/22)

"As decisões aqui reproduzidas são apenas informativas."

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